Ele é hoje em dia um dos maiores agitadores culturais do país. Ator, produtor e empresário, Maurício divide seu tempo na TV, no cinema, produzindo e atuando em peças e também administrando o belíssimo Teatro Safra, no qual é curador artístico.
A partir de outubro irá dar vida ao deputado Arlindo Nacib, na nova novela das 21h, A Lei do Amor. Com vocês, o talentoso Maurício Machado.
- Quando você iniciou sua carreira artística?
Profissionalmente em 1987. Em um teste para um Musical, em que estreei protagonizando e que soube através de classificados de jornais. Mas antes a peregrinação foi grande. Com a recusa de meus pais aos 13 anos de idade, por me matricular no famoso curso O Tablado do Rio (era o único que eu aos 12 anos tinha ouvido falar), tive a sorte de na semana seguinte receber a circular na escola de um grupo de teatro amador que se montaria no rígido colégio Salesiano que estudava. Havia um empecilho. Embora fosse gratuito, precisava da assinatura de meus pais já que os encontros eram aos sábs. e doms. não hesitei e falsifiquei. 10 meses de encontros e não deu em nada, entrei em 4 grupos de Teatro Amador que eu mesmo descobri com essa idade ... todos terminaram, e no quinto fiz 5 dias depois minha estreia como ‘príncipe’ num orfanato de meninas no Méier. Até hoje jamais dei tanto autógrafo na vida! rs.
- Qual foi o momento que você percebeu que tinha veia para a arte?
Desde menino. Bem menino já tinha a certeza disso. Ficava magnetizado diante da TV vendo Oscarito (naqueles filmes preto e branco), Grande Othelo, Paulo Gracindo, Dercy, Chico Anysio, Jô Soares, Armando Bógus, Ary Fontoura, Yara Amaral, o Sítio do Pica-Pau Amarelo, tantos outros ...Não falava por timidez, embora já tivesse certeza de que seria aquilo que desejava e me causava um fascínio louco, uma conexão absurda com minha identificação e lugar no mundo. Mas era um universo tão longínquo da minha realidade familiar que tinha até vergonha de falar. E quando finalmente tive; foi um desastre. Um balde de água mais que fria. De família muito católica, a primeira manifestação teatral que tenho lembrança em meus olhos ...são as procissões da igreja. Achava lindo aquilo e uma grande celebração acima de tudo artística. A primeira vez que entrei num Teatro, para assistir uma peça de Teatro, eu tinha 11 anos, fui levado por uma colega da escola, mais velha e descolada, e entrei sabe lá Deus como ... pq a peça tinha censura 18 anos. Tinha a Claudia Raia no elenco, e era a estreia também dela como atriz no Teatro. Uma menina ! (olha o mundo como é ... hoje tenho a honra de estar no elenco de uma novela do horário nobre com ela). Fui assistindo a peça, inebriado com tudo aquilo, o lugar, o perfume que jamais me esqueci, as risadas, a magia da cena, e tendo certeza de que tinha encontrado meu lugar no Mundo !
- Você é carioca. O que o levou a tentar a carreira em SP?
O Destino. Um belo acaso que agradeço à Deus, e a saudosa atriz Mara Manzan, que conheci no camarim do Teatro João Theotônio no centro do Rio em 1988, eu então com 16 anos de idade. Ficamos amigos. Amizade instantânea, e Mara se tornou uma terceira mãe minha (antes de minha própria e minha Tia/Madrinha). Me convidou para sua estreia em SP, e eu abusado que já era ... fui. Falsifiquei identidade para pegar o busão na rodoviária Novo Rio ... estava terminando o segundo grau, cursando inglês, com namorada, e iniciaria dali há 1 mês e meio os ensaios de um infantil ‘A
Revolta dos Brinquedos’. Saindo de casa ... minha mãe me disse e jamais esqueci: ‘Não vai me arranjar trabalho em SP ! Vc. tem sua casa, seus estudos e vida aqui !’. fui na sexta e voltava no domingo. Voltei 10 dias depois ... tendo magicamente estreado uma peça da Maria Clara Machado, um dos nomes máximos do Teatro Carioca ... em SP !! Como protagonista em ‘O Patinho Feio’, substituindo um ator que havia se acidentado. Minha mãe quase infartou. E eu 2 meses depois disso, com a peça ainda em cartaz para a qual eu ia todo final de semana ainda morando no Rio fazê-la, atendo o fone, e recebo a notícia de que estava indicado ao Prêmio Apetesp como ator revelação de 1988, e a cerimônia seria dali há 2 semanas no Theatro Municipal de SP, assim conheci o Municipal de Sampa ouvindo meu nome naquele palcão pelas vozes de Nicette Bruno e Paulo Goulart. Dali um mundo em SP se descortinou de possibilidades nunca antes pensadas. Mas, sempre muito desejadas e queridas: Ter e alcançar não a fama e estrelato, mas RESPEITO. E viver do meu ofício. Juntou o desejo, com a benção do destino. E à SP, devo tudo o que sou ... inclusive hoje na minha cidade: O Rio.
- Qual foi a novela que mais te marcou? Qual personagem?
Tive a sorte e felicidade de na TV fazer papéis bem distintos. Mas, até hoje em restaurantes os cozinheiros, garçons, maitrés me reconhecem e falam comigo do atrapalhado do Baltazar, meu primeiro grande papel em TV na novela ‘Alma Gêmea’, de Walcyr Carrasco. Então sem dúvida foi essa. O Henrique que veio na sequência era o oposto ... um personagem dramático, um guerrilheiro político da ditadura militar, torturado ... na novela do Lauro Cesar Muniz ‘Cidadão Brasileiro’ também me deu muito prazer e emoção fazer. Era muito forte aquilo.
‘Cama de Gato’, ‘Cordel Encantado’ foram como estar no playground brincando e se divertindo ... com belos parceiros de cena e em sucessos. ‘Chiquititas’ foi uma explosão no contato imediato na rua com as crianças. Como fazia um bandidão, achei que seria apedrejado por elas. Eram só carinho!
- Como é a experiência de ser dono de um teatro? O que o levou a ser curador artístico de um grande teatro, como o Safra?
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Quando me perguntavam qual era o meu maior sonho ... sempre respondia: Ter um Teatro!
Deixava os produtores de elenco de TV, alvo de 9 em cada 10 atores bem descansados ... porque meu foco era o Teatro e tudo que tiraria dele: Respeito e o sonho de minha subsistência através dele e meu ofício.
Minha paixão, meu tesão e obstinação por Teatro são tão grandes... que é o lugar que quem quer mesmo me encontrar vai esbarrar comigo ... no palco onde estarei ou nas centenas de plateias que procuro estar toda semana. Vendo tudo. Gosto do cheiro do Teatro, fico horas apreciando no saguão as fisionomias de quem vai e escolhe ir ao Teatro. Atendendo na bilheteria, o telefone com o publico, se pudesse passava o dia vendendo os ingressos, Sentindo os perfumes, achando uma delícia aquele burburinho da plateia ... antes de começar uma apresentação. Se pudesse moraria num Teatro !! Ou se pudesse ainda ... faria Teatro de Terça a Domingo como em muitas décadas passadas.
Foi algo que busquei, corri e lutei por anos e anos ... tive e vendi o espaço do Teatro do Shopping Vila Olímpia, estive perto de arrendar outros, outros em negociações infindáveis ... Mas, não aconteceram. Não era o momento, e nem a hora certa, aos desejos de Deus. Minha trajetória como Ator de Teatro, e como Homem que produz Teatro (para realizar seus próprios trabalhos e outros para sobreviver), foram um caminho natural ... para aquilo que vc. sonha, luta, projeta e se sincero e com empenho ... conquista !
A parte administrativa de finanças, de gente, de equipe, de burocracia ... é o que mais dá trabalho e dor de cabeça, a Curadoria Artística é a alma da questão, um trabalho infindável, diário ... e ai de você que não seja ... Mas, dá uma satisfação e prazer absurdo ver que você colabora para o fomento da Cultura do país e da cidade que vive e paga seus impostos em prol de uma sociedade. Tecendo essa rede com cuidado, com destreza levando em consideração o ineditismo, o talento e a relevância artística em todos os gêneros e estilos desde que haja: qualidade e talento !
No Teatro Safra |
- Você é ator, produtor, empresário. Como consegue administrar tudo isso em 24 horas?
Não sei. Ando pensando muito sobre isso ... atualmente!
Mas, tem muita relação com sobrevivência em primeiro lugar. Não venho de família abastada, e tudo que construí ou alcancei foi fruto de muito, mas muito trabalho. Férias é uma palavra que mal conheço no vocabulário. Este ano tirei uma por 11 dias, depois de 5 anos sem. Trabalho cerca de pelo menos 14 horas por dia, e o resto que sobra é para minha vida e dormir. Por vezes as coisas se misturam ... e é impossível se desligar em casa das coisas do escritório que trata das produções culturais, do Teatro e dos eventos. A exceção é a chave que ligo e desligo do Ator, para este desligo de tudo ... para estar por inteiro. Vindo de filhos de Portugueses imigrantes, minha formação foi pautada no entendimento que a vitória pela forma tradicional e ortodoxa, pode levar muito; no meu caso levou muito tempo; .. mas, é consistente, sólida e dá muito orgulho. Não há vitória sem esforço, dedicação e empenho. No Brasil e em se tratando de Arte por aqui isso deve ser multiplicado por 3. Meus frutos e respeito começaram a vir depois de longos e árduos 20 anos de labuta incansável. Caindo, subindo e voltando. E outro dia li algo incrível que resume isso: "É o homem mais ocupado que tem mais tempo livre". Já notou que num ambiente de trabalho aquele que faz corpo mole, joga sempre para o outro mais agilizado e competente a fazer ... e esse somatiza atribuições? Tem clara relação com o estar conectado com o Divino na minha opinião ... aqui, temos a distorcida visão que trabalhamos para agradar ao chefe. Não, nós devemos agradar-nos a nós mesmos, nos superarmos, e assim estamos em plenitude com o Divino. Minha sábia mãe definia com clareza em sua simplicidade: ‘Quem corre por gosto, não se cansa !’
Ao lado de Klara Castanho, sua colega de elenco |
- Sua próxima peça será o espetáculo "Aprendiz de Feiticeiro", de Antônio Calmom. Como surgiu esse convite?
Este é um projeto antigo meu ... há anos tomei as rédeas de meu destino e escolhas no Teatro.
Por necessidade, por sobrevivência, mas também pela possibilidade de assim poder ter a decisão do que fazer e com quem. Tem o aspecto negativo ... de te esquecerem como possibilidade no mercado teatral já que você próprio produz suas coisas ..., aqui no Brasil a visão ainda é compartimentada demais. Então ‘Aprendiz de Feiticeiro’ foi um projeto do meu escritório idealizado por meu sócio,
Eduardo Figueiredo, que também dirige o espetáculo. Fiquei muito animado com a ideia, com o papel, e com a lembrança do Calmon que é um craque e está mega feliz de agora fazer sua estreia no Teatro depois de tão profícua contribuição no cinema e tv brasileiros. Só tem craque nesse time ....
- Você já viveu um feiticeiro antes no teatro? Como está sendo essa preparação?
Feiticeiro é o primeiro. Vendo muitos filmes que deram origem a justamente essa nossa obra precursora que é a matéria prima de nosso espetáculo: Goethe, com esse seu conto ‘Aprendiz de Feiticeiro’. A partir dele vieram: ‘Fantasia’ da Disney, ‘Harry Potter’, ‘Senhor do Anéis’ etc. Lendo muito também, decorando, pesquisando ... Os ensaios são exaustivos, o espetáculo está tomando uma proporção cada vez maior ... e a equipe das melhores do Teatro Brasileiro contribuirão certamente para um grande sucesso ! O trabalho do ator é sempre um trabalho coletivo ... mas no que tange a criação depende muito de si, imersão, concentração e isso é bastante solitário.
- A convite da autora Thelma Guedes, você participou de leituras de contos, que serão exibidas pelo Canal Futura? Quais foram os contos lidos? Você já os conhecia?
Foi um grande presente da Thelma Guedes. Uma honra poder ter lido e dado algum elemento sugerido na interpretação àqueles belos contos (uma vez que a ideia era mais lê-los, do que propriamente interpretá-los), mas acabei dando vida aos 2 distintos personagens dos contos: “As Mãos de Davi Jurubeba” e “A Cabeça de Chico Ferreira”.
O livro ‘O Outro Escritor’ é uma preciosidade, fui na noite de autógrafos do livro. Desde que li escrevi para ela para dizer-lhe sobre a força de sua escrita, o quanto cada conto era diametralmente oposto um do outro. Mas, quão forte e imagéticos eram. A força que tinham ou teriam se transpostos para o audiovisual ... e de alguma forma aquilo que senti lendo o livro e seus contos todos se materializou. Ela reuniu uma trupe de grandes colegas a quem admiro que realizaram esse trabalho com a direção esmerada de Hemerson Coutinho.
Recomendo a leitura do livro, e assistirem os vídeos filmados de alguns dos contos.
Gravando um dos contos de Thelma Guedes |
- Na TV você já se prepara para viver um deputado corrupto, na próxima novela das 21h, a Lei do Amor. Como está sendo esta experiência? O que você espera do personagem?
Foi uma feliz surpresa o convite. Que veio para um teste. E na verdade meu primeiro teste na TV Globo. Todos os demais trabalhos que fiz na emissora tive a felicidade e honra de ser convidado. Então, acaba que é talvez um prazer redobrado, um gosto mais especial de conquista e vitória. A equipe é amabilíssima, a sinergia e a energia no workshop coletivo já deram o tom de como será um trabalho feliz e fadado ao sucesso !!
Fora que o texto da Maria Adelaide Amaral e do Vincent Villari é fluído, te fisga, te deixa motivado a ver e saber mais e mais. E digo isso só de ler os primeiros capítulos.
Sem contar a honra enorme que é para mim sem tamanho de poder contar uma história e viver um personagem criado por esta gênia chamada Maria Adelaide Amaral. Para mim das melhores dramaturgas que o Teatro já conheceu. Espero e tenha certeza de nada menos que o sucesso coletivo de todos nós!
E o merecido dos autores, direção, produção ...
- Você pode adiantar um pouquinho sobre a história de Arlindo Nacib?
É um deputado corrupto e inescrupuloso, que tem como cúmplice e seu grande parceiro e aliado o senador, vivido pelo Otávio Augusto.
- Por falar em deputados, gostaria de falar sobre a nossa política hoje?
Qualquer coisa que fale ou diga é pouco ou palidamente inconsistente sobre os fatos que nos atropelam a cada instante, a história está se contando em minutos e imagino o que os livros futuros não contarão sobre o panorama político atual do Brasil. Isso é ... se a histórica não for retorcida ou manipulada.
Mas, vejo com bons olhos esse momento em que mesmo com a desbragada voz que as redes sociais trouxeram ao povo ... onde todo mundo emite opiniões, muitas vezes sem fundamento, sem embasamento ... há um interesse político, de transformação muito legítimo que trouxe substanciais avanços. E que tirou o povo brasileiro de uma inércia sobre seu ‘status quo’.
- Com quem você gostaria ainda de contracenar nos palcos ou na TV?
Meu Deus ! São tantos ... esse país é de riqueza de talentos na Arte de interpretar. Mas, seria fantástico dividir a cena com Fernanda Montenegro, Nathalia Timberg, Eva Wilma, Marieta Severo, Renata Sorrah, Walderez de Barros, Fagundes, Marco Nanini, Ary Fontoura e Tony Ramos. Os atores mais velhos sempre foram uma enorme referência e inspiração para mim. Dos mais novos Glória Pires seria um sonho. Ela é uma devoradora das lentes, sabe tudo de audiovisual. Beth Goulart e Matheus Nachtergaele também adoraria.
- Se tivesse um convite para viver uma personalidade já falecida nos palcos, quem gostaria de homenagear?
Já tenho ! E será meu próximo espetáculo. Que faria este ano ... Mas, com a novela tive de acomodar, para após o término dela ... farei Franz Kafka. No texto já pronto e espetacular de Sergio Roveri. ‘Um Beijo em Franz Kafka’.
- Como você mantém a boa forma?
Tenho intensificado o ritmo de treinamentos em meio a confusão da minha vida com trabalhos ... A Casa de espetáculos em SP, a peça ensaiando, os pré-compromissos antes de começar a gravar a novela, as produções novas que pretendo estrear e produzir, um filme que estou co-produzindo enfim ... Mas, a preocupação com a boa forma é muito maior que questões estéticas, tem relação com a necessidade fundamental para a energia em cena, ter fôlego, vigor e a disposição do condicionamento físico de um ator, que em muito se assemelha a de um Atleta por vezes. Detesto academia. Então como sou disciplinado o resultado físico precisa estar condicionado também à uma necessidade para o papel. Tenho ido todos os dias à academia e minha esteira em casa deixou de ser peça decorativa ou aparador. Rs.
- É adpeto a um tipo de alimentação?
Sou bom de garfo. Como de tudo ... Não tenho problema em não comer isso ou aquilo. Fui felizmente criado assim, e quanto já se passou por privações tem-se um olhar mais respeitoso também com os alimentos. Mas, de uns 2 anos para cá, não como praticamente nada de fritura, faz 1 ano que eliminei quase por completo farinha branca do cardápio, e carboidratos à noite são raros em minha vida. Há anos conheço a dieta do tipo sanguíneo e é algo que há muito quero fazer. Sei da sua eficácia, meu tipo não é muito afeito a carnes vermelhas. Mas talvez por isso ainda não tenha começado ... (rs) eu adoro !
- Deixe um recado para os leitores da Revista Básica.
Obrigado Revista Básica pelo convite. Parabéns pelos serviços e a longevidade e um carinhoso abraço a todos os seus leitores. Vamos manter contatos ... estou nas redes sociais: Instagram, Twitter e Facebook.
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